O acolhimento familiar não era uma prioridade?

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São mais de 8000 as crianças institucionalizadas em Portugal, muitas delas com histórias de vida com um passado traumático e para quem o Estado não tem dedicado a atenção que se impunha.

A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo é clara ao afirmar a necessidade de privilegiar o acolhimento familiar em detrimento do acolhimento residencial, especialmente para crianças até aos 6 anos. Sempre que há necessidade de executar uma medida de promoção e proteção em regime de colocação, retirando uma criança do seu ambiente natural de vida, separando-a da sua família biológica por perigo biopsicossocial, o acolhimento familiar é a melhor opção em detrimento do acolhimento residencial. Está cientificamente comprovado. É este o princípio da prevalência da família. É na família que o crescimento de uma criança deve ser privilegiado. A Convenção Internacional dos Direitos da Crianças assim o refere.

Das crianças que estão com medida de promoção e proteção em regime de colocação, apenas 3% encontram-se em acolhimento familiar. O sistema português de acolhimento tem seguido um caminho em sentido contrário aos restantes países europeus no que a esta temática diz respeito.

É, aliás, um sistema que trata estas famílias de colhimento de forma discriminatória. O mesmo Estado que permite que se deduza as despesas com os animais de estimação em sede de IRS não deixa que as famílias de acolhimento deduzam as despesas com as creches destas crianças. É, por esta razão, que a JSD quer que este tipo de despesas com as crianças possa ser fiscalmente aceite. Tal como quer que seja corrigida a injustiça de em caso de doença ou de necessidade de acompanhamento destas crianças as faltas destes pais de acolhimento não serem justificadas. Tal como a JSD, e o PSD, também o PS supostamente queria melhorar e apostar no acolhimento familiar. Isto apesar de o atraso na regulamentação da lei de 2015 não apontar nesse sentido.

Foi, por isso, que fiquei atónica quando nesta semana soube das declarações da secretária de Estado para a Inclusão, no âmbito da apresentação do relatório CASA (Caracterização Anual da Situação de Acolhimento) relativo a 2017. Afirmou que é intenção do governo deixar de entregar mais crianças a famílias de acolhimento por falta de meios de supervisão e de fiscalização.

Contrariando recomendações internacionais, contrariando o que seria mais recomendável para as crianças, contrariando o próprio Partido Socialista, que ainda há pouco tempo alegava a aposta no acolhimento familiar. Há milhares de crianças à guarda do Estado a quem não é dada a oportunidade de estar em situação de acolhimento familiar. Porque o Estado pura e simplesmente assume que desistiu delas. E o PS que há umas semanas defendia a aposta no acolhimento familiar é cúmplice e convivente com uma intenção que vai à revelia daquilo que é o interesse destas crianças.

Se há papel que os partidos têm a obrigação de assumir, até para a credibilização da sua atividade, é o de garantir que o Estado não pode em circunstância alguma deixar ninguém para trás, especialmente as crianças.

Margarida Balseiro Lopes, Presidente da JSD

 

Negligência, maus tratos e abusos. Mais de 2.200 crianças institucionalizadas no último ano

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Relativamente a 2016, há menos 8% de crianças em risco institucionalizadas, e nos últimos dez anos houve uma descida de 25% no número de crianças e jovens sinalizados.

 

O número de crianças e jovens em perigo acolhidos em famílias ou instituições desceu em 2017, uma tendência constante na última década, registando-se 7.553 em acolhimento e 2.857 que saíram dessa situação no ano passado.

“Portugal começa a dar sinais positivos no caminho da prevenção e/ou redução da institucionalização de crianças e jovens”, lê-se na “Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens” relativo a 2017.

No ano passado foram 2.202 as entradas no sistema de acolhimento, a maior parte por causa de negligência, falta de supervisão e acompanhamento (41%). Em 16% dos casos, o acolhimento deveu-se a “comportamentos desviantes”.

Em 400 casos considerou-se que foram vítimas de mais tratos psicológicos, 8% casos de exposição a violência doméstica, enquanto 215 casos chegaram ao sistema por terem sido sujeitos a maus tratos físicos e abuso sexual.

A esmagadora maioria (90%) destas novas entradas nunca tinha estado no sistema de acolhimento, mas em 240 casos tratou-se de um regresso, uma vez que já tinham saído, mas foi “detetada nova ou reiterada situação de perigo”.

Das novas entradas, 394 seguiram “procedimento de urgência”.

A maior parte das crianças e jovens em perigo acolhidas são rapazes, entre os 12 e os 20 anos de idade, que compõem 72% do total.

As casas de acolhimento generalista recebem 87% das situações, mesmo no caso das crianças até 5 anos – 88% de um universo de 903 crianças.

Em acolhimento familiar, que continua a ser de “fraca expressão”, estavam em 2017 apenas 3% das crianças e jovens em perigo.

O tempo de acolhimento costuma durar em média 3,6 anos, o que aconselha “atenção aos motivos” para tanto tempo de permanência e esforços para aplicar os “planos individuais de intervenção”.

No que toca às saídas do sistema em 2017, aumentaram 14% em relação ao ano anterior, na maioria rapazes a partir dos 15 anos que saíram de lares de infância e juventude para voltarem a viver em família, quer a de origem quer adotiva.

Em 984 casos, registaram-se “problemas de comportamento” ligeiros, que exigem “maior atenção”.

Entre os que estão em acolhimento, havia “comportamentos disruptivos em 28%”, sobretudo nas idades entre os 12 e os 17 anos, acompanhados psicologicamente e, em 22% dos casos, com medicamentos.

Para 91% das crianças e jovens em acolhimento houve educação e formação, creche ou ensino pré-escolar.

Durante o acolhimento são orientados para um projeto de vida, o que se conseguiu em 92,3% dos casos em 2017, mais 1,7 pontos percentuais do que em 2016.

A maior parte destes projetos aponta para a autonomização, sobretudo nas idades entre os 12 e os 20, enquanto a reunificação familiar é predominante na faixa 6-11 anos (43,5%).

Em cerca de um terço das crianças até aos 5 anos, o projeto de vida definido foi a adoção.

Lusa

Adopção está em queda e a tendência é para que continue assim

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Entre as crianças e jovens em situação de acolhimento em 2017, só 9% acalentavam a adopção como projecto futuro, o que representa o valor mais baixo da última década. Instituto de Segurança Social admite que queda da natalidade vai fazer diminuir os casos de adopção.

Há menos crianças e jovens a saírem de lares de acolhimento por terem sido adoptados e são também menos os que ainda estão à guarda do Estado que tenham a adopção como projecto de vida para o futuro.

Estas são algumas das tendências evidenciadas pelo relatório Casa — Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens relativo a 2017, que foi divulgado nesta segunda-feira pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

E o que este relatório mostra, por exemplo, é o seguinte: das 7533 crianças e jovens que estavam acolhidos pelo Estado em 2017 por terem sido abandonados pela família ou por esta os pôr em risco, apenas 673 (9%) tinham a adopção como projecto de vida futura. É o valor mais baixo dos últimos dez anos.

Uma fonte oficial do Instituto de Segurança Social (ISS) atribui esta quebra à mudança de universo que entretanto se registou entre a população acolhida: aumentaram os jovens com idades mais velhas e diminuíram os que estão em escalões etários mais baixos (ver texto nestas páginas).

Como é natural, os projectos de adopção assumem maior expressão entre as crianças mais novas, tendo um peso de 38,3% no grupo dos zero aos três anos e 32,4% nos que têm quatro a cinco anos. No grupo dos 12 aos 14 anos esta proporção desce para 5,7%. Legalmente, a adopção só é viável até aos 15 anos.

A mesma fonte do ISS frisa também que esta redução se deve ainda ao “grande foco” que continua a ser privilegiado nas estratégias para o futuro e que passa pela criação de condições para que as crianças e jovens acolhidas possam regressar às suas famílias de origem.

Na prática, só são dados como adoptáveis quando falham todas as possibilidades deste regresso se concretizar e esta é uma das razões que justifica a discrepância existente entre o número das crianças e jovens que permanecem em acolhimento e o daqueles que acabam por ser adoptados. Esta situação é frequentemente criticada pelos candidatos a pais adoptivos.

O relatório CASA mostra que entre as crianças e jovens que estavam em acolhimento em 2017, 25 voltaram a esta situação por terem ficado de novo em risco no processo de pré-adopção.

O que fica também a saber-se para já é que apenas 38% (256) dos 673 candidatos à adopção tinham já em 2017 uma decisão sobre o seu caso e que, destes, só sete contavam com famílias para “futura adopção”, sendo que para os outros o máximo a que se chegou foi a chamada “medida de confiança a instituição com vista a futura adopção”. Ou seja, foram dados como adoptáveis mas o desfecho do seu caso continuava em aberto.

Entre os que terminaram o seu período de acolhimento em 2017 a situação é idêntica. Dos 2857 que deixaram de estar à guarda do Estado, apenas 9% o fizeram por terem como destino a adopção, o que constitui uma redução de 22% por comparação a 2016.

Outra fonte oficial do ISS considera que, à semelhança do que acontece noutros países europeus, a redução do número de adopções em Portugal é um fenómeno que “irá acentuar-se” devido sobretudo a dois factores: há menos crianças disponíveis devido à queda da natalidade e as condições de vida das famílias vão continuar a melhorar.

Clara Viana

 

Famílias de acolhimento “congeladas” até existirem meios de fiscalização

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Aviso foi feito pela secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência. Em dez anos, a colocação de crianças em risco em famílias sem serem as suas sofreu um decréscimo de 73%. Em 2017 existiam 7553 crianças e jovens em situação de acolhimento, o que é também o número mais baixo numa década.

Chamam-se famílias de acolhimento e são uma das soluções que a nível internacional tem vindo a ser privilegiada para dar guarida às crianças e jovens que são retirados aos seus núcleos familiares por se encontrarem em risco. Em Portugal continua a ser uma opção minoritária e por agora assim vai continuar, garantiu nesta segunda-feira a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes.

“Enquanto não tivermos os meios necessários para garantir a supervisão e fiscalização das famílias de acolhimento não nos sentimos seguros para aumentar o seu número, embora seja essa a nossa vontade”, disse na apresentação do relatório Casa – Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens relativo a 2017.

Sem esta fiscalização, o acolhimento familiar pode constituir “um susto” já que tudo se passa dentro de portas, sem outras testemunhas do que os membros da família, o que não sucede nos lares para crianças e jovens, frisa Ana Sofia Antunes.

O relatório CASA dá conta de que só existem actualmente 178 famílias de acolhimento e que no espaço de uma década se registou uma redução de 73% na oferta desta solução. Segundo o Instituto de Segurança Social (ISS), tal ficou a dever-se em primeiro lugar ao facto de a partir de 2009 ter sido proibida a colocação de menores em famílias com as quais tivessem laços de parentesco, o que era até então a principal opção.

Certo é que no ano passado só 3% (246) dos 7553 menores que estavam em situação de acolhimento tinham sido colocados em famílias, apesar de a lei em vigor recomendar que se privilegie o acolhimento numa família, em especial quando as crianças têm até seis anos. E da prática internacional ter levado Portugal a ficar incluído na “liga dos últimos”, como disse ao PÚBLICO há um mês o professor de Serviço Social e Política Social no Trinity College, em Dublin, Robbie Gilligan, que faz investigação sobre crianças e jovens à guarda do Estado.

PÚBLICO -

Seis ou mais anos em lares

À semelhança do que sucede nos lares, o acolhimento familiar é concebido para ser temporário. Mas o relatório CASA mostra que a maioria (149) das 246 crianças colocadas em famílias permanece por lá seis ou mais anos. Nos lares esta é a situação em que se encontram 19,6% dos cerca de 6600 menores ali acolhidos, sendo que 43,2% permanecem nestas casas durante um ano ou menos. A duração média do acolhimento nas várias respostas é de 3,6 anos.

É uma experiência que o ISS descreve como sendo “devastadora na vida das crianças em acolhimento”, mas que foi vivida por 2687 menores (35,6%) que em 2017 estavam nesta situação. Trata-se da dança entre instituições, as chamadas transferências de um lar para outro, que por vezes se repetem duas ou mais vezes como sucedeu com 637 dos menores acolhidos.

Acolhimento sobe entre os mais velhos

Este é um dos aspectos do actual sistema de acolhimento que irá merecer particular atenção por parte da tutela, no âmbito da revisão do actual sistema de protecção que terá de ser levada por diante devido sobretudo à “alteração do seu público-alvo”, afirma a secretária de Estado. E em que consiste esta mudança? Na última década “registou-se um crescimento de 4% no acolhimento do grupo entre os 15 e os 18 anos, ao mesmo tempo que se verificou um decréscimo de 40% no escalão dos zero aos 14 anos”.

Ou seja, as crianças e jovens em acolhimento são hoje mais velhas e isso impõe que as respostas existentes sejam “adequadas a este novo universo”, defende Ana Sofia Antunes, que aponta como exemplo o incremento dos chamados apartamentos de autonomização, onde os utentes são acompanhados com vista à sua transição para a vida adulta. Em 2017 havia 79 jovens nestes apartamentos.

PÚBLICO -

Aumentar

No total, o número de crianças e jovens em acolhimento em 2017 (7553) é o mais baixo em dez anos. Para Ana Sofia Antunes são “boas notícias”, uma vez que esta redução, afirma, resulta de existir “mais e melhor trabalho de acompanhamento” e também de uma aposta forte na prevenção.

Problemas de comportamento e não só

Entre as crianças e jovens acolhidos continuam a ser maioritários (61%), contudo, os que, no léxico dos técnicos, apresentam “características particulares”, sendo que muitos acumulam mais do que uma. Entre estas “características particulares”, a que tem maior peso (28%) respeita a problemas de comportamento, seguindo-se-lhe os relacionados com a área da saúde mental (19%). Estes valores são semelhantes aos de 2016. No conjunto, cerca de metade dos jovens em acolhimento têm acompanhamento regular por parte de psiquiatras e psicólogos.

PÚBLICO -

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Os problemas de comportamento são também frequentes entre os 2857 jovens que terminaram o acolhimento em 2017, afectando 34% desta população. O segundo maior problema prende-se com o consumo de estupefacientes, que é seguido por 403 (14%) dos menores que abandonaram o acolhimento, sendo que cerca de 100 são descritos como toxicodependentes. Dos que saíram em 2016, 76 estavam nesta última situação.

A maior parte (64%) dos que cessaram o acolhimento em 2017 voltaram para a família, mas o fim desta experiência também foi ditado por várias outras razões, entre as quais fugas prolongadas (mais de um mês) que levaram o sistema a dar baixa de 77 dos seus utentes.

Os que desaparecem

É a primeira vez que o fenómeno das fugas prolongadas é analisado num relatório CASA e essa será a razão por sobrarem ainda muitas dúvidas. Por exemplo, por que é que no grupo dos 15 aos 20 anos são as raparigas que estão em maioria entre os fugitivos? Cerca de 60 desapareceram durante mais de um mês, enquanto entre os rapazes este número desce para 37. No total houve 116 fugas prolongadas.

Outra novidade deste último relatório CASA é a apresentação de dados relativos aos menores estrangeiros que estão em acolhimento por se encontrarem abandonados. São 46 no total e, segundo o ISS, a maioria foi vítima de redes de tráfico humano.

Como tem sido norma, a principal situação de perigo dos jovens que estavam em acolhimento em 2017 prende-se com casos de negligência, a que se seguem os maus-tratos psicológicos e físicos.

Clara Viana

Número de crianças acolhidas pelo Estado cai 8%. A maioria tem mais de 12 anos

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Menores acolhidos pelo Estado estão mais velhos, o que obriga a repensar as respostas sociais, alerta a secretária de Estado. Institucionalizações estão a cair e, em 2017, foram 7.533.

São maioritariamente rapazes, a maioria tem acima dos 12 anos e passam, em média, 3,6 anos em instituições do Estado. O retrato anual do acolhimento de crianças e jovens em Portugal — o CASA 2017 — acaba de ser divulgado e há duas conclusões que saltam à vista: o número de crianças acolhidas em 2017 caiu 8% em relação ao ano anterior e os menores à guarda do Estado estão cada vez mais velhos. Mais de cinco mil jovens, num total de 7.533 acolhidos, têm acima de 12 anos, uma fatia que representa 72%. O grupo com maior peso continua a ser o dos adolescentes, entre os 15 e os 17 anos, num total de 2.735 jovens (36%).

“Mudámos o nosso público-alvo”, disse a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, durante o briefing aos jornalistas, referindo-se ao facto de as crianças e jovens acolhidos estarem mais velhos. Para além disso, a última alteração legislativa prevê que o acompanhamento do Estado possa ser feito até aos 25 anos de idade, se o jovem decidir prolongá-lo depois de atingida a maioridade. “Tudo isso faz com que os desafios sejam cada vez maiores”, explicou Ana Sofia Antunes.

“Com a maioria dos jovens acolhidos a pertencer à faixa etária dos 15 aos 18 anos e a verificar-se um decréscimo nas crianças acolhidas com idades inferiores, isto implica adequar as respostas que o Estado oferece. O desafio que um jovem apresenta é muito diferente do desafio de uma criança mais pequena. Este novo público-alvo chega com muito mais complexidades e desafios”, para além de a maioria ter necessidade de acompanhamento psicológico, sublinhou a governante.

Os dados confirmam as palavras da secretária de Estado. A faixa etária dos 18 aos 20 anos já representa 18% do número de menores acolhidos, com um aumento de 3% em relação ao ano anterior. Por outro lado, os jovens com mais de 15 anos representam 53% do total. Já as quedas verificaram-se entre as crianças mais novas: dos 0-3 anos e dos 6-9 anos houve menos 1% de menores acolhidos.

Com este cenário, o desafio principal, explicou Ana Sofia Antunes, é ser capaz de pensar em respostas diferentes, como a pré-autonomização. Nesse sentido, o CASA mostra que em 2017, ano a que se reportam os dados, o número de apartamentos de autonomização cresceu 72% (de 46 para 79) e houve também um aumento das casas de acolhimento especializado. Estas últimas são destinadas a jovens dos 12 aos 18 anos, com graves dificuldades emocionais que se traduzem em comportamento disruptivo ou em elevado perigo para si próprios. As casas funcionam em regime aberto e só são utilizadas depois de se ter esgotado outro tipo de intervenção.

Ao serem em regime aberto, potenciam situações de fuga. Em 2017, houve 77 fugas prolongadas (mais de um mês) e que determinaram o arquivamento dos processos de promoção. A solução será sempre prevenir as fugas e nunca alterar o regime aberto, explicou a secretária de Estado.

Fonte do Instituto da Segurança Social, presente no briefing, explicou que apesar do crescimento daqueles dois tipos de acolhimento, e que se explica pelo aumento da idade dos jovens acolhidos, estas soluções são muito específicas e a sua utilização deve ser ponderada. Assim, a aposta deverá ser antes nos centros de acolhimento generalistas, dotando-os dos meios necessários para responderem eficazmente aos problemas dos jovens acolhidos.

Saúde mental, um problema que afeta 14% dos jovens

A complexidade dos jovens acolhidos, como aponta a secretária de Estado, passa pelas características especiais desta franja da população e que são apontadas no relatório CASA. Entre as cerca de sete mil crianças acolhidas, 61% tem pelo menos uma dessas características que passam, por exemplo, por problemas de comportamento (28%), toxicodependência, consumo esporádico de estupefacientes ou suspeita de prostituição. Na maioria das vezes, os jovens têm mais do que uma identificada: houve 11.115 características encontradas nos cerca de quatro mil jovens.

Do lado da saúde mental, como referido por Ana Sofia Antunes, entre as 4.582 crianças e jovens que revelam alguma das características especiais, 22% tomam medicação psiquiátrica, 21% têm acompanhamento psiquiátrico regular e 19% sofrem de debilidade, deficiência ou problemas de saúde mental.

Por isso mesmo, a mesma fonte do Instituto de Segurança Social diz que as crianças e jovens acolhidos são cada vez mais desafiantes. “Há cada vez mais percentagem de jovens com problemas, que têm necessidade de acompanhamento psiquiátrico e psicológico e este problemas de saúde mental exigem aos cuidadores respostas muito específicas”, explicou, avançando que está a ser feito um esforço grande na qualificação da rede de acolhimento e uma aposta no reforço dos cuidados continuados de saúde mental.

Para além da qualificação da rede, a secretária de Estado também diz ser necessário dar respostas capazes aos jovens quando saem do acolhimento para evitar situações já identificadas — mas não quantificadas pela governante — de menores que depois de saírem das instituições se tornaram sem-abrigo.

Números de crianças acolhidas cai 8%

Os números globais mostram que o sistema está a caminhar no sentido previsto: diminuir ao máximo a institucionalização de menores, optando antes por medidas de proteção em meio natural de vida, ou seja, sem afastar as crianças e jovens das suas famílias.

Assim, pela primeira vez desde que há registo, o número de crianças e jovens desce abaixo dos oito mil. Esta redução é acompanhada por uma outra também de 8%: houve um número menor de crianças (2.202) a entrar no sistema em 2017, menos 194 do que no ano anterior. Em contrapartida, 2.857 crianças e jovens cessaram o acolhimento, mais 344 do que o ano anterior. Este crescimento de 14% é o maior de sempre. Boas notícias, segundo a secretária de Estado, que lhe acrescenta uma outra, o decréscimo de jovens acolhidos em dez anos foi de 24%.

“Tivemos menos crianças a entrar no sistema e tivemos mais saídas — do ponto de vista global isto são boas notícias — e são resultado de um trabalho que está a começar a dar frutos. Nas últimas duas décadas trabalhámos na mudança do sistema que tínhamos, um sistema que era eminentemente caritativo, muito baseado em respostas sociais e muito judicializado”, sustentou Ana Sofia Antunes. Hoje, disse, esse sistema foi transformado num sistema de proteção dos direitos das crianças, e que aposta muito na prevenção das situações de risco. Para isso, o Instituto de Segurança Social trabalha em parceria com os municípios e, entre outras coisas, melhorou-se o acompanhamento de famílias beneficiárias do rendimento social de inserção e de ação social para prevenir situações de risco.

“Os números de acolhimento estão a decrescer, mas não é só porque sim, isto é resultado de um trabalho de maior e melhor acompanhamento. E não é só no trabalho de prevenção, é também uma maior aposta na formação de todos os agentes, nas comissões de proteção de crianças e menores e na tentativa de aprimorar as respostas dadas”, sublinhou a secretária de Estado.

Mais apoio às famílias, menos adoções

Em 2017, os serviços de proteção de menores detetaram 17.600 situações de risco que envolviam os 7.533 menores acolhidos. A fatia mais gorda é a da negligência, onde cabem 71% das situações de risco apuradas. Dentro dela, a falta de supervisão e acompanhamento familiar — criança deixada entregue a si ou com irmãos igualmente crianças, por largos períodos de tempo — aconteceu a 58% dos menores. Abusos sexuais foram detetados em 3% dos casos de menores acolhidos e maus-tratos físicos em 4%.

Mas um pouco mais de metade destas crianças, antes do acolhimento, já tinha tido algum tipo de medida de proteção. A esmagadora maioria foi de apoio aos pais (44%) ou a outro familiar (10%), tendo a primeira crescido 2% em relação ao ano anterior.

Este reforço das medidas juntos dos pais foi explicado no briefing com a vontade de manter o foco na prevalência da criança na família. Já os números de adoção, caíram.

“Esse será cada vez mais o caminho”, disse outra fonte do Instituto de Segurança Social presente no briefing. “A adoção a acontecer será cada vez mais a internacional e menos a doméstica, porque o que se pretende é apoiar as famílias, evitando o acolhimento. E quando o acolhimento acontece, a prioridade será sempre o regresso ao meio natural de vida.” Só 9% das crianças que cessaram o acolhimento o fizeram por ter sido integradas em famílias adotantes.

A esmagadora maioria das crianças e jovens acolhidos tinham um projeto de vida definido, ou seja, estava delineado para onde deveriam ir a seguir, depois de terminado o acolhimento. Este projeto é traçado por técnicos e não pelos tribunais. O mais comum, para 38% dos jovens, principalmente entre os 15 e os 20 anos, é a autonomização, seguindo-se de perto a reintegração na família nuclear (36%) que é a mais frequente na faixa etária entre os 6 e os 11 anos. Em terceiro lugar, surge a adoção (10%) para 673 crianças. Há ainda 9% para quem, por motivos de doença física ou mental, se prevê o seu acolhimento permanente.

Entre as crianças e jovens acolhidos com projeto de vida definido, 673 tinham como projeto a adoção (10%) e, em 2017, segundo o CASA, 97,2% dessas crianças viram a adoção concretizada. Em situação de pré-adoção, ou seja, já entregue a uma família, havia 257 crianças.

Em relação às restantes, o que aconteceu quando o acolhimento cessou? Como explicou a secretária de Estado, apesar de os serviços fazerem uma grande aposta na autonomização, verificou-se que 64% das crianças e jovens foram reintegrados ou no seio da família nuclear ou da alargada. A vida autónoma foi motivo de cessação para apenas 6,8% dos jovens.

Esta inversão do que era esperado levará os serviços a terem de refinar os seus critérios quando traçam projetos de vida, concluiu Ana Sofia Antunes, apostando-se cada vez mais na reintegração familiar.

 

Ana Kotowicz