Parlamento aprova alterações ao Regime de Execução do Acolhimento Familiar

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O parlamento aprovou esta sexta-feira os projetos de lei de PS, CDS-PP, PSD e PAN, que alteram o Regime de Execução do Acolhimento Familiar, dando assim mais direitos e apoios às famílias que acolhem crianças e jovens em risco.

Os quatro projetos de lei relativos às famílias de acolhimento, que baixam agora à comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social para discussão na especialidade, foram aprovados em votação na generalidade, no plenário da Assembleia da República.

O diploma do PS mereceu a abstenção dos centristas e os votos favoráveis das restantes bancadas, enquanto os do PSD, PAN e CDS-PP tiveram todos a mesma votação: a abstenção do PS e os votos a favor dos restantes partidos.

O direito à justificação de faltas para assistência à família, a dedução das despesas de saúde e educação em sede fiscal e mais apoio financeiro às famílias de acolhimento, são algumas das propostas dos projetos-lei hoje aprovados.

O PS propõe que as despesas das famílias de acolhimento de crianças e jovens em risco sejam fiscalmente dedutíveis, defendendo ainda o reconhecimento de direitos laborais como a justificação de faltas para a assistência à família.

Com esta proposta, o objetivo do PS é “colmatar lacunas que a lei hoje em vigor apresenta, dignificando o papel social destas famílias”.

Já o PSD, na sua proposta de alteração do decreto-lei de 2008, quer que durante a vigência do contrato de acolhimento, a criança ou jovem seja considerada membro do agregado familiar para efeitos de deduções de IRS.

As famílias de acolhimento poderão dispor do direito a faltas para assistência à criança ou jovem, segundo a mesma proposta dos sociais-democratas.

O CDS-PP, por seu lado, defende que qualquer dos titulares do contrato de acolhimento deve ter o direito a licenças e faltas para assistência às crianças ou jovem a seu cargo.

Os centristas pretendem ainda que, durante a vigência do contrato de acolhimento, a criança ou jovem seja considerado no âmbito do agregado família para todos os efeitos fiscais, assim como para efeitos de conceção de apoios sociais ao acolhimento familiar.

O PAN, no seu projeto de lei, propõe medidas que considera promoverem uma política efetiva de desinstitucionalização de crianças e jovens, considerando, por exemplo que as famílias deveriam receber 329 euros de apoio à manutenção da criança, sem quaisquer impostos adjacentes.

“Tendo em conta o trabalho desenvolvido pelas famílias de acolhimento, que têm o desafio de cuidar de uma criança emocionalmente afetada por ter sido separada dos pais, este valor é bastante modesto, especialmente quando comparado com o valor pago noutros países, sendo por isso essencial que se considere o seu aumento”, defende o PAN.

O PAN preconiza também que as crianças numa família de acolhimento devem ter, em todos os casos, direito ao abono de família, à semelhança do que acontece com o pagamento do abono às instituições.

O benefício, às famílias, de uma licença idêntica à licença parental, como forma de permitir a criação de laços, assim como do regime de faltas ao trabalho, previstos na legislação laboral, para assistência à criança acolhida são outras das alterações propostas pelo PAN.

Um País que privilegia orfanatos a famílias de acolhimento

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“Precisamos de soluções sistémicas articuladas para os problemas destas famílias a nível social, fiscal e laboral. É essencial que se considere o aumento do valor para apoio à criança acolhida.”

Em 2015 o Parlamento aprovou legislação que privilegia a aplicação da medida de acolhimento familiar sobre a de acolhimento residencial, em especial relativamente a crianças até aos 6 anos. No entanto, está a acontecer precisamente o oposto. A situação em Portugal quando comparada com outros países europeus é particularmente preocupante, com o acolhimento residencial a assumir uma fortíssima expressão atingindo valores superiores a 90% do total das medidas de colocação aplicadas pelos Tribunais e Comissões de Protecção de Crianças e Jovens. Não só o acolhimento familiar tem um valor percentual muito reduzido, como se tem tornado progressivamente menos expressivo. Ou seja, as famílias de acolhimento não estão a ser privilegiadas face às instituições, quando as crianças são retiradas aos pais.

Os números portugueses são, de forma muito evidente, os piores entre os países desenvolvidos. Na Irlanda e na Austrália, o acolhimento familiar é a opção em 90% por cento dos casos. Nos países do Sul da Europa, a medida é aplicada a, pelo menos, metade das crianças e jovens em risco. O caso português já gerou alertas internacionais, tanto dos inspectores da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, que Lisboa assinou em 1989, como da Comissão Europeia que em 2013 recomendou aos países da União que pusessem termo “à multiplicação das instituições destinadas a crianças privadas de cuidados parentais, privilegiando as famílias de acolhimento”.

O pediatra Charles Nelson, da Universidade de Harvard, referiu numa entrevista que por vezes utiliza Portugal como um mau exemplo: “Tem demasiadas crianças em centros de acolhimento e isso não é bom”. O sentimento de abandono que advém da percepção de ser estar num orfanato ou numa instituição semelhante, a ausência de laços afectivos e de rotinas familiares têm impactos negativos no desenvolvimento cognitivo das crianças e dos jovens, no seu desenvolvimento humano e na sua integração na sociedade.

Precisamos de soluções sistémicas articuladas para os problemas destas famílias a nível social, fiscal e laboral. É essencial que se considere o aumento do valor para apoio à criança acolhida. As crianças que estão acolhidas nestas famílias devem ter, em todos os casos, direito ao abono de família, à semelhança do que acontece com o pagamento do abono dessa mesma criança a uma instituição e devem beneficiar da atribuição do 1.º escalão do abono de família para que possam beneficiar de acção social escolar.

Por outro lado, para efeitos do cálculo das mensalidades pagas no equipamento social ou educativo, a Segurança Social deverá dar indicações para que os regulamentos internos que determinam os cálculos das mensalidades nas IPSS e nas autarquias passem a considerar as crianças que estão integradas numa família de acolhimento nas mesmas condições das crianças que vivem em instituições. As famílias de acolhimento deverão ainda beneficiar de uma licença idêntica à licença parental e beneficiar do regime de faltas ao trabalho, previstos na legislação laboral, para prestação de assistência à criança acolhida que, para efeitos fiscais, deve passar a ser considerada como fazendo parte do agregado familiar.

André Silva