Campos de férias são ponte de viragem em vidas invisíveis

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Associação Candeia e projeto Amigos pra Vida acompanham e promovem a vida de crianças e jovens institucionalizados com atividades durante o ano e um acampamento em agosto

Lisboa, 09 ago 2019 (Ecclesia) – As relações de amizade criadas em campos de férias e em atividades com crianças e jovens institucionalizadas são “ponte de viragem”, afirma Madalena Oliveira, da associação Candeia, num esforço de dar uma resposta que o Estado não consegue.

“Não conseguimos levar todos os miúdos porque a procura é muita e a lotação de cada campo é de 42 participantes”, afirma à Agência ECCLESIA Madalena Oliveira, presidente da associação Candeia que dá conta de uma crescente procura.

Nos últimos “três anos” a Candeia verificou que o maior número de solicitações encontra-se “nos mais velhos”.

“Este ano tivemos 87 pedidos de jovens entre os 15 e os 18 para participar no campo e levámos apenas 42”, regista, explicando com a falta de resposta que a casas de acolhimento têm para as crianças e jovens que “vão ficando até à idade adulta”.

Por outro lado, registam que “crianças entre os seis e os 11 são cada vez menos”.

Desde 1991 que a associação Candeia trabalha com as instituições de acolhimento para crianças e jovens e procura acompanhá-los ao longo de todo o ano com atividades diversas que culminam com o campo de férias em agosto.

São 23 casas de acolhimento que endereçam pedidos de inscrição para os campos de férias.

Os campos de férias da associação dividem-se por faixa etária entre os três e cinco ano; seis e 11; 12 a 14 e, por último, dos 15 aos 18 anos.

Os 42 participantes são acompanhados por animadores, normalmente entre os 18 e os 30 anos, que “estabelecem relação com as crianças e os jovens ao longo das atividades do ano”, esclarece Madalena Oliveira.

“Durante todo o ano, fazemos atividades, algumas semanais nas casas e instituições, outras mensais onde propomos às casas tirarmos os miúdos e irmos passear, organizamos acantonamentos nos fins-de-semana e campos de férias em agosto”, indica a presidente da associação, advogada de formação que se divide profissional e emocionalmente entre a Candeia e a sua profissão.

Campo de férias 2019; Foto: Associação Candeia

“É pena não conseguirmos dar uma resposta a todas as crianças que acabam por ficar de fora”, lamenta indicando que um dos critérios é a participação, e consequente conhecimento da criança ou jovem, que se estabelece ao longo do ano.

Há crianças novas que não integram o campo, mas, por outro lado, a associação acompanha crianças que começaram aos seis anos a participar nas suas atividades, e por continuarem institucionalizadas, “participam no campo de férias com 18”.

Durante a semana de campo de férias “selvagem”, este ano em Abrantes e a decorrer até ao final do mês, fazem-se jogos pedagógicos, existem momentos de partilha, de brincadeira, jogos no rio e muito contacto com a natureza.

“Os campos são selvagens e não temos nenhum contacto com a civilização; estamos sem eletricidade, convidamos e desafiamos os jovens a viver em simplicidade e a perceber que o essencial não é o supérfluo que nos acompanha diariamente. Com muito pouco fazemos muito na vida destas crianças”, relata.

Os animadores, todos voluntários, num compromisso “exigente”, dedicam-se dois a três meses a organizar o campo, “com muito amor e entrega” para pensar nas atividades, este ano sob o lema «Sou teu amigo, sim».

“O slogan da Candeia é «Da relação nasce a luz»: as relações de proximidade criam laços e são esses laços e através do exemplo de vida dos animadores, que os miúdos acabam por se inspirar e perceber que existem alternativas para a sua vida”, sublinha Madalena Oliveira.

Os participantes no campo de férias “têm uma rede social muito frágil que não dá resposta” tornando as relações de amizade fonte de “resposta para as suas vidas, e uma resposta muito positiva”.

“Eles podem errar connosco: não vão ser julgados e vão ter sempre novas oportunidades. Eles precisam delas e nas coisas mais pequeninas. Muitas vezes é nos momentos de campos de férias, em que tratamos mal o nosso amigo e percebemos que podemos ser perdoados, esses momentos fazem a diferença nas suas escolhas e vidas”, sublinha.

Dentro da associação Candeia nasceu o projeto Amigos pra Vida que procura o estabelecimento de laços, seja através da adoção, apadrinhamento civil ou ajudas pontuais, e a criação de uma rede de amizade em torno de uma criança ou jovem institucionalizado.

“Temos a experiência como animadores e percebemos que podíamos desafiar outros na sociedade civil com a mesma vontade e possibilidade de lhes dar outras oportunidades”, esclarece Madalena Oliveira que encara as atividades da Candeia como “poucas” e para um universo de crianças e jovens que continuam invisíveis.

“Quando se ouvem estatísticas, escutamos números; para nós os números são caras, pessoas e miúdos que conhecemos desde uma idade muito jovem. Para vermos que existem oito mil crianças institucionalizadas em Portugal, lembramos as 300 que conhecemos, ou as 500 que conheci nos 10 anos que estou na Candeia. Para mim não são um número, são miúdos em particular, o Afonso, o Bruno, a Maria e a Cristina”, dá conta Madalena Oliveira.

Para a responsável este é um “voluntariado exigente” marcado por uma grande responsabilidade porque “na próxima atividade, os participantes vão perguntar por nós”.

“Os laços e relações que criamos são sérios, tal como criamos relações com amigos. Nós não falhamos aos nossos amigos e na Candeia não falhamos aos participantes”, sublinha.

LS

 

Negligência, maus tratos e abusos. Mais de 2.200 crianças institucionalizadas no último ano

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Relativamente a 2016, há menos 8% de crianças em risco institucionalizadas, e nos últimos dez anos houve uma descida de 25% no número de crianças e jovens sinalizados.

 

O número de crianças e jovens em perigo acolhidos em famílias ou instituições desceu em 2017, uma tendência constante na última década, registando-se 7.553 em acolhimento e 2.857 que saíram dessa situação no ano passado.

“Portugal começa a dar sinais positivos no caminho da prevenção e/ou redução da institucionalização de crianças e jovens”, lê-se na “Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens” relativo a 2017.

No ano passado foram 2.202 as entradas no sistema de acolhimento, a maior parte por causa de negligência, falta de supervisão e acompanhamento (41%). Em 16% dos casos, o acolhimento deveu-se a “comportamentos desviantes”.

Em 400 casos considerou-se que foram vítimas de mais tratos psicológicos, 8% casos de exposição a violência doméstica, enquanto 215 casos chegaram ao sistema por terem sido sujeitos a maus tratos físicos e abuso sexual.

A esmagadora maioria (90%) destas novas entradas nunca tinha estado no sistema de acolhimento, mas em 240 casos tratou-se de um regresso, uma vez que já tinham saído, mas foi “detetada nova ou reiterada situação de perigo”.

Das novas entradas, 394 seguiram “procedimento de urgência”.

A maior parte das crianças e jovens em perigo acolhidas são rapazes, entre os 12 e os 20 anos de idade, que compõem 72% do total.

As casas de acolhimento generalista recebem 87% das situações, mesmo no caso das crianças até 5 anos – 88% de um universo de 903 crianças.

Em acolhimento familiar, que continua a ser de “fraca expressão”, estavam em 2017 apenas 3% das crianças e jovens em perigo.

O tempo de acolhimento costuma durar em média 3,6 anos, o que aconselha “atenção aos motivos” para tanto tempo de permanência e esforços para aplicar os “planos individuais de intervenção”.

No que toca às saídas do sistema em 2017, aumentaram 14% em relação ao ano anterior, na maioria rapazes a partir dos 15 anos que saíram de lares de infância e juventude para voltarem a viver em família, quer a de origem quer adotiva.

Em 984 casos, registaram-se “problemas de comportamento” ligeiros, que exigem “maior atenção”.

Entre os que estão em acolhimento, havia “comportamentos disruptivos em 28%”, sobretudo nas idades entre os 12 e os 17 anos, acompanhados psicologicamente e, em 22% dos casos, com medicamentos.

Para 91% das crianças e jovens em acolhimento houve educação e formação, creche ou ensino pré-escolar.

Durante o acolhimento são orientados para um projeto de vida, o que se conseguiu em 92,3% dos casos em 2017, mais 1,7 pontos percentuais do que em 2016.

A maior parte destes projetos aponta para a autonomização, sobretudo nas idades entre os 12 e os 20, enquanto a reunificação familiar é predominante na faixa 6-11 anos (43,5%).

Em cerca de um terço das crianças até aos 5 anos, o projeto de vida definido foi a adoção.

Lusa

Número de crianças e jovens em acolhimento baixou 33% nos últimos dez anos

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O número de crianças e jovens em casas de acolhimento baixou 33% nos últimos dez anos, passando de 12.245 em 2006 para 8.175 no ano passado, revela um relatório do Instituto da Segurança Social

Segundo o Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens CASA 2016, o número de crianças e jovens dos zero aos 20 anos caracterizados no sistema de acolhimento familiar e residencial abrangeu 10.688 casos em 2016, menos 4.328 do que há dez anos (29%).

Destes, 8.175 (76%) encontravam-se nas 310 casas de acolhimento existentes no país, menos 425 (5%) face a 2015.

Apesar do decréscimo no número de crianças acolhidas, verificou-se em 2016 um aumento no número de novas entradas e uma redução do número de saídas.

De acordo com o CASA, 2.396 menores (22%) foram acolhidos em 2016, mais 194 relativamente a 2015 (9%), e 2.513 deixaram o acolhimento, menos 2.513 (4%), a maioria para regressar à família e 259 crianças (10%) foram integradas numa família adotante em período de pré-adoção.

Em 2016, manteve-se uma “ligeira prevalência” de rapazes (52,7%) e “um claro predomínio” de jovens com idades entre os 12 e os 20 anos (69,4%).

Os jovens chegam ao sistema “cada vez mais crescidos e mais complexos” o que exige respostas mais específica, afirmou uma técnica do Instituto da Segurança Social (ISS) num encontro com jornalistas no Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Esta situação deve-se ao facto de ter sido tentado que o jovem ficasse junto da família, segundo a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, uma vez que mais de metade teve, antes do acolhimento, uma medida em meio natural de vida.

No entanto, salienta o relatório, terá de manter-se em atenção “o número de crianças (3.087) cuja primeira iniciativa de intervenção foi a aplicação de uma medida de acolhimento que determinou o seu afastamento” da família.

A grande maioria (7.203 — 88,1%) encontra-se em Lares de Infância e Juventude Especializado e centros de acolhimento temporário, 576 (7%) em casas de acolhimento com modelos de intervenção específicos nas áreas da saúde, educação especial ou Segurança Social, e 63 (0,8%) estavam em apartamentos de autonomização.

Cerca de 3% (261) estavam em famílias de acolhimento, adianta o relatório, observando que estas famílias estão concentradas no norte do país, principalmente nos distritos do Porto, Vila Real, Braga e Viana do Castelo, enquanto em Lisboa, onde o número de crianças em acolhimento é dos mais elevados, não existe nenhuma.

Havia ainda 192 crianças e jovens, 17 dos quais menores de 11 anos, em comunidade terapêutica, devido a problemas de toxicodependência e álcool.

O relatório alerta para a importância da duração do acolhimento, advertindo que 74% das crianças em acolhimento familiar estão acolhidas há mais de quatro anos, o mesmo tempo para 33,7% das que estão em instituições.

Sobre os motivos que levaram ao acolhimento da criança ou do jovem, o relatório aponta o principal foi negligência associada a “falta de supervisão familiar” (4.826), seguido da “exposição a modelos desviantes” e de “comportamentos desviantes”, detetados em 832 crianças.

O documento revela também que 17% das crianças foram acolhidas longe do seu contexto familiar de origem, das quais 46% tinham entre 15 e 17 anos, sublinhando que isto só pode ocorrer “quando o superior interesse da criança assim o determine”

Lusa