Famílias de acolhimento “congeladas” até existirem meios de fiscalização

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Aviso foi feito pela secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência. Em dez anos, a colocação de crianças em risco em famílias sem serem as suas sofreu um decréscimo de 73%. Em 2017 existiam 7553 crianças e jovens em situação de acolhimento, o que é também o número mais baixo numa década.

Chamam-se famílias de acolhimento e são uma das soluções que a nível internacional tem vindo a ser privilegiada para dar guarida às crianças e jovens que são retirados aos seus núcleos familiares por se encontrarem em risco. Em Portugal continua a ser uma opção minoritária e por agora assim vai continuar, garantiu nesta segunda-feira a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes.

“Enquanto não tivermos os meios necessários para garantir a supervisão e fiscalização das famílias de acolhimento não nos sentimos seguros para aumentar o seu número, embora seja essa a nossa vontade”, disse na apresentação do relatório Casa – Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens relativo a 2017.

Sem esta fiscalização, o acolhimento familiar pode constituir “um susto” já que tudo se passa dentro de portas, sem outras testemunhas do que os membros da família, o que não sucede nos lares para crianças e jovens, frisa Ana Sofia Antunes.

O relatório CASA dá conta de que só existem actualmente 178 famílias de acolhimento e que no espaço de uma década se registou uma redução de 73% na oferta desta solução. Segundo o Instituto de Segurança Social (ISS), tal ficou a dever-se em primeiro lugar ao facto de a partir de 2009 ter sido proibida a colocação de menores em famílias com as quais tivessem laços de parentesco, o que era até então a principal opção.

Certo é que no ano passado só 3% (246) dos 7553 menores que estavam em situação de acolhimento tinham sido colocados em famílias, apesar de a lei em vigor recomendar que se privilegie o acolhimento numa família, em especial quando as crianças têm até seis anos. E da prática internacional ter levado Portugal a ficar incluído na “liga dos últimos”, como disse ao PÚBLICO há um mês o professor de Serviço Social e Política Social no Trinity College, em Dublin, Robbie Gilligan, que faz investigação sobre crianças e jovens à guarda do Estado.

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Seis ou mais anos em lares

À semelhança do que sucede nos lares, o acolhimento familiar é concebido para ser temporário. Mas o relatório CASA mostra que a maioria (149) das 246 crianças colocadas em famílias permanece por lá seis ou mais anos. Nos lares esta é a situação em que se encontram 19,6% dos cerca de 6600 menores ali acolhidos, sendo que 43,2% permanecem nestas casas durante um ano ou menos. A duração média do acolhimento nas várias respostas é de 3,6 anos.

É uma experiência que o ISS descreve como sendo “devastadora na vida das crianças em acolhimento”, mas que foi vivida por 2687 menores (35,6%) que em 2017 estavam nesta situação. Trata-se da dança entre instituições, as chamadas transferências de um lar para outro, que por vezes se repetem duas ou mais vezes como sucedeu com 637 dos menores acolhidos.

Acolhimento sobe entre os mais velhos

Este é um dos aspectos do actual sistema de acolhimento que irá merecer particular atenção por parte da tutela, no âmbito da revisão do actual sistema de protecção que terá de ser levada por diante devido sobretudo à “alteração do seu público-alvo”, afirma a secretária de Estado. E em que consiste esta mudança? Na última década “registou-se um crescimento de 4% no acolhimento do grupo entre os 15 e os 18 anos, ao mesmo tempo que se verificou um decréscimo de 40% no escalão dos zero aos 14 anos”.

Ou seja, as crianças e jovens em acolhimento são hoje mais velhas e isso impõe que as respostas existentes sejam “adequadas a este novo universo”, defende Ana Sofia Antunes, que aponta como exemplo o incremento dos chamados apartamentos de autonomização, onde os utentes são acompanhados com vista à sua transição para a vida adulta. Em 2017 havia 79 jovens nestes apartamentos.

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No total, o número de crianças e jovens em acolhimento em 2017 (7553) é o mais baixo em dez anos. Para Ana Sofia Antunes são “boas notícias”, uma vez que esta redução, afirma, resulta de existir “mais e melhor trabalho de acompanhamento” e também de uma aposta forte na prevenção.

Problemas de comportamento e não só

Entre as crianças e jovens acolhidos continuam a ser maioritários (61%), contudo, os que, no léxico dos técnicos, apresentam “características particulares”, sendo que muitos acumulam mais do que uma. Entre estas “características particulares”, a que tem maior peso (28%) respeita a problemas de comportamento, seguindo-se-lhe os relacionados com a área da saúde mental (19%). Estes valores são semelhantes aos de 2016. No conjunto, cerca de metade dos jovens em acolhimento têm acompanhamento regular por parte de psiquiatras e psicólogos.

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Os problemas de comportamento são também frequentes entre os 2857 jovens que terminaram o acolhimento em 2017, afectando 34% desta população. O segundo maior problema prende-se com o consumo de estupefacientes, que é seguido por 403 (14%) dos menores que abandonaram o acolhimento, sendo que cerca de 100 são descritos como toxicodependentes. Dos que saíram em 2016, 76 estavam nesta última situação.

A maior parte (64%) dos que cessaram o acolhimento em 2017 voltaram para a família, mas o fim desta experiência também foi ditado por várias outras razões, entre as quais fugas prolongadas (mais de um mês) que levaram o sistema a dar baixa de 77 dos seus utentes.

Os que desaparecem

É a primeira vez que o fenómeno das fugas prolongadas é analisado num relatório CASA e essa será a razão por sobrarem ainda muitas dúvidas. Por exemplo, por que é que no grupo dos 15 aos 20 anos são as raparigas que estão em maioria entre os fugitivos? Cerca de 60 desapareceram durante mais de um mês, enquanto entre os rapazes este número desce para 37. No total houve 116 fugas prolongadas.

Outra novidade deste último relatório CASA é a apresentação de dados relativos aos menores estrangeiros que estão em acolhimento por se encontrarem abandonados. São 46 no total e, segundo o ISS, a maioria foi vítima de redes de tráfico humano.

Como tem sido norma, a principal situação de perigo dos jovens que estavam em acolhimento em 2017 prende-se com casos de negligência, a que se seguem os maus-tratos psicológicos e físicos.

Clara Viana

Número de crianças e jovens em acolhimento baixou 33% nos últimos dez anos

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O número de crianças e jovens em casas de acolhimento baixou 33% nos últimos dez anos, passando de 12.245 em 2006 para 8.175 no ano passado, revela um relatório do Instituto da Segurança Social

Segundo o Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens CASA 2016, o número de crianças e jovens dos zero aos 20 anos caracterizados no sistema de acolhimento familiar e residencial abrangeu 10.688 casos em 2016, menos 4.328 do que há dez anos (29%).

Destes, 8.175 (76%) encontravam-se nas 310 casas de acolhimento existentes no país, menos 425 (5%) face a 2015.

Apesar do decréscimo no número de crianças acolhidas, verificou-se em 2016 um aumento no número de novas entradas e uma redução do número de saídas.

De acordo com o CASA, 2.396 menores (22%) foram acolhidos em 2016, mais 194 relativamente a 2015 (9%), e 2.513 deixaram o acolhimento, menos 2.513 (4%), a maioria para regressar à família e 259 crianças (10%) foram integradas numa família adotante em período de pré-adoção.

Em 2016, manteve-se uma “ligeira prevalência” de rapazes (52,7%) e “um claro predomínio” de jovens com idades entre os 12 e os 20 anos (69,4%).

Os jovens chegam ao sistema “cada vez mais crescidos e mais complexos” o que exige respostas mais específica, afirmou uma técnica do Instituto da Segurança Social (ISS) num encontro com jornalistas no Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Esta situação deve-se ao facto de ter sido tentado que o jovem ficasse junto da família, segundo a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, uma vez que mais de metade teve, antes do acolhimento, uma medida em meio natural de vida.

No entanto, salienta o relatório, terá de manter-se em atenção “o número de crianças (3.087) cuja primeira iniciativa de intervenção foi a aplicação de uma medida de acolhimento que determinou o seu afastamento” da família.

A grande maioria (7.203 — 88,1%) encontra-se em Lares de Infância e Juventude Especializado e centros de acolhimento temporário, 576 (7%) em casas de acolhimento com modelos de intervenção específicos nas áreas da saúde, educação especial ou Segurança Social, e 63 (0,8%) estavam em apartamentos de autonomização.

Cerca de 3% (261) estavam em famílias de acolhimento, adianta o relatório, observando que estas famílias estão concentradas no norte do país, principalmente nos distritos do Porto, Vila Real, Braga e Viana do Castelo, enquanto em Lisboa, onde o número de crianças em acolhimento é dos mais elevados, não existe nenhuma.

Havia ainda 192 crianças e jovens, 17 dos quais menores de 11 anos, em comunidade terapêutica, devido a problemas de toxicodependência e álcool.

O relatório alerta para a importância da duração do acolhimento, advertindo que 74% das crianças em acolhimento familiar estão acolhidas há mais de quatro anos, o mesmo tempo para 33,7% das que estão em instituições.

Sobre os motivos que levaram ao acolhimento da criança ou do jovem, o relatório aponta o principal foi negligência associada a “falta de supervisão familiar” (4.826), seguido da “exposição a modelos desviantes” e de “comportamentos desviantes”, detetados em 832 crianças.

O documento revela também que 17% das crianças foram acolhidas longe do seu contexto familiar de origem, das quais 46% tinham entre 15 e 17 anos, sublinhando que isto só pode ocorrer “quando o superior interesse da criança assim o determine”

Lusa