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26.08.2020 | jn.pt

Apadrinhamento civil: só seis crianças propostas em 2019

Catarina Silva

É o número mais baixo dos últimos três anos. Há 7032 menores institucionalizados.
Lei que queria dar-lhes uma família, mantendo ligação aos pais biológicos, ainda falha.

 

Dez anos depois da entrada em vigor da figura do apadrinhamento civil, que queria dar uma família a crianças institucionalizadas e sem projeto de adoção, os números continuam a ser residuais. Em 2019, as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) só propuseram seis crianças para apadrinhamento civil – o número mais baixo dos últimos três anos – e quatro dos casos já foram homologados pelo tribunal. A lei pecou pela falta de divulgação e os seus mentores acreditam que a falta de um subsídio às famílias também tem travado o sucesso.

Há dez anos, não havia quem tivesse dúvidas sobre a pertinência do apadrinhamento civil“, diz Guilherme de Oliveira, especialista em Direito de Família e mentor da lei. Foi criada a pensar nas crianças para quem a adoção não é uma opção, mas que também não podem estar com a família Há 7032 menores institucionalizados  Últimas Mais Vistas Alertas biológica. “Era preciso inventar uma forma de proteção familiar duradoura e não transitória. Imaginei esta figura, inspirada nos padrinhos religiosos, substitutos dos pais“.

O grande objetivo era retirar crianças das instituições. Segundo a lei, os padrinhos civis assumem responsabilidades parentais para o resto da vida, mas as crianças não perdem ligação aos pais biológicos, ao contrário do que acontece na adoção.

FALTA DE DIVULGAÇÃO

Apesar das expectativas, os números foram sempre residuais. O último relatório Caracterização Anual da Situação de Acolhimento de Crianças e Jovens (CASA) revela que, em 2018, havia 7032 crianças institucionalizadas e o apadrinhamento civil foi proposto a apenas 29, o número mais baixo desde 2013. Em 2019, segundo a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, as CPCJ de todo o país só o propuseram a seis crianças (três entre 11 e 14 anos; uma entre 6 e 10 anos; uma entre 3 e 5 anos, uma com menos de 2 anos).

A medida também pode ser proposta pelo Ministério Público ou a Segurança Social. “A falta de divulgação foi um defeito desde o início. O Governo não fez a parte dele“, defende Guilherme de Oliveira. O facto de se manter contacto com os pais biológicos não lhe parece ser um travão, até porque a ideia é exatamente a cooperação. “Magistrados, técnicos, todos conheciam casos em que a figura se enquadrava. Se há dez anos fazia falta, então, continua a fazer“. Agora, arrepende-se de não ter avançado o muito debatido subsídio, como o que é entregue às famílias de acolhimento. “O sistema exige muito dos pais e o subsídio ajudava”.

O investigador Paulo Delgado, subscreve: “Temos que ver a realidade da pouca disponibilidade económica das famílias. A falta de apoio até pode ser injusta”. Mas o problema está em quebrar o ciclo família-instituição: “Somos campeões da institucionalização de crianças. Não acredito que Portugal seja diferente de países como Espanha ou Itália. Estas famílias existem, mas o nosso sistema de proteção não as procura“. E critica o Governo: “Há muito boas intenções do ponto de vista jurídico. Há consenso do ponto de vista científico sobre o efeito da institucionalização nas crianças, com atrasos cognitivos e físicos. Mas, do ponto de vista político, há resistência“.

Rosário Farmhouse, presidente da CNPDPCJ, assume que “a medida tem potencial que não é usado“. “Temos poucos candidatos a serem padrinhos e não há efeito de contágio. Isto requer uma campanha de divulgação”. Idália Serrão, à época secretária de Estado da Reabilitação, concorda: “O que resolve o desconhecimento é a formação. Se os técnicos não conhecem os instrumentos, não os aplicam. Continuo a acreditar que faz sentido. Não substitui nenhuma outra medida de proteção”.

 

©José Carmo/Arquivo Global Imagens